sexta-feira, 8 de julho de 2011

Exame de Ordem II

Digo para ler as duas postagens abaixo antes de ler esta.

Eu fiz o Exame de Ordem (EO) que teve 84% de reprovação (EO 2010.2)– felizmente fui aprovado. Foi a primeira prova elaborada e aplicada pela Fundação Getúlio Vargas. Como disse abaixo, os EO não são fáceis.

Entretanto, o aspecto a ser abordado é outro: um paralelo entre o EO e o ENADE – aquela prova que diz avaliar a qualidade do ensino superior brasileiro.

Vamos ao primeiro ponto. Não se faz carnaval para o EO, como se faz para o ENADE? Por quê? Tenho para mim alguns dos motivos, os quais passo a descriminar abaixo. Fiz o ENADE no ano de 2009, última (atual) avaliação para o curso de Direito – ou ao menos fui ao local de prova e li a avaliação. Ambas as provas estão na internet: basta digitar no Google e comparar.

O EO realmente avalia o conteúdo estudado pelo bacharel em sua formação acadêmica, o que não é o caso do ENADE. É fácil ter boa nota no ENADE. Em outras palavras: o exame é ridículo, tanto em seu conteúdo quanto no grau de dificuldade.

Quando eu escrevi “carnaval” não foi nenhum exagero. Muitas instituições de ensino superior “estimulam” até o cansaço o aluno a fazer a prova. Fazem camisas do tipo “ENADE: EU FUI!”, “MINHA FACULDADE É 4!”, etc. Acreditem se quiser: existe Faculdade que faz cursinho para o ENADE – isso mesmo! Em um período anterior à prova abrem uma disciplina que revisa conteúdos da avaliação. Existe algo mais ridículo? Além do mais, exigem a presença do aluno, ou se a presença não é exigida concedem pontuação na média dos acadêmicos como uma espécie de ônus a ser suportado. Digo o seguinte: a instituição que promove verdadeiros “cursinhos” para o ENADE não confia no conteúdo repassado aos seus alunos ou não acredita que seus alunos possam fazer uma prova pífia. Falta-me expressão para expor o quanto isso é ridículo. Na ausência dos termos, fico com o nada.

No mais: oferecem lanche para os alunos; a entrada do local de prova é uma festa: barra de cereal com folhetos de propagandas das Faculdades e cursinhos preparatórios para concursos, distribuição de brindes os mais variados possíveis. Isso até dá para entender, com algum esforço.

Então, algumas instituições de ensino superior pegam seus alunos no colo, os vestem, dão comida, fazem carinho – tudo em prol de uma boa avaliação em uma prova que não avalia absolutamente nada. Claro, aos olhos da sociedade que não está por dentro de um esquema com interesses espúrios, uma Faculdade com conceito 5 no ENADE é garantia de qualidade. Papo furado: pode ser um atestado de garantia tabajara. Não garante nada a ninguém.

O pior de tudo: muitos alunos fazem a prova acreditando que contribuem para algo significativo: minha faculdade terá bom conceito no ENADE. São massa de manobra de um grupo com interesses capitalistas – é a única coisa que podem ser. Não tem como não lembrar de “Revolução dos Bichos”, grande fábula de George Orwell. Que fique claro: nos termos postos, relação apaixonada entre aluno e faculdade é uma grande besteira. Não existe romance. A instituição não gosta de você, gosta do que você tem – se é possível personalizar a esse ponto uma instituição de ensino superior. Neste tocante me refiro às particulares: nunca vi uma instituição de ensino superior pública fazer esse carnaval por causa do ENADE.

No meu caso, em particular, até os alunos do meu curso decidirem boicotar a prova (por motivo justo e não por baderna), a instituição pouco se manifestou sobre o exame: colocou um papel na parede de um dos corredores do curso com a relação de alunos que deveriam fazer a prova. Após o anúncio de um boicote à prova houve uma verdadeira guerra, em razão de se atingir interesses de alguns que freqüentam o campus – interesses que nem discuto aqui, pois são internos e nada tem a ver com a proposta deste blog.

O que eu digo, e com certa dose de orgulho, é que a Faculdade que eu cursei é nota 1 no ENADE/2009 e no EO que reprovou 84% dos candidatos teve a maior aprovação na primeira fase: cerca de 97%. Em termos de aprovação em primeira e segunda fases, é a que mais aprova no Espírito Santo. Digo mais: o curso se saiu bem em todas as edições do antigo provão e do ENADE (o que não diz muita coisa, é verdade) – conceito A e B, sendo que em um dos anos foi considerado o melhor curso de Direito do Brasil. O conceito B veio de uma tentativa de boicote – como é possível perceber, não teve sucesso. Por fim, apesar de eu não mais fazer parte da Universidade, no EO 2010.3 (o último) a instituição está entre as 20 que mais aprovaram (53,19% dos presentes) – o que deve e precisa melhorar: o índice já foi maior. Válido lembrar que muitas instituições mal conseguem atingir 5% de aprovação daqueles que foram inscritos.

Não existe necessidade de se divulgar isso em “outdoors” ou em grandes redes de rádio ou televisão. No máximo acontece como agora neste blog: faz-se um comentário e pronto. Afinal, o que faz a Faculdade? Os alunos. No meu caso, por vezes o corpo de professores foi vacilante, mas existem grandes mestres na instituição, sem dúvida. Os alunos também dão tiro n’água, obviamente.

O segundo ponto. Não existe interesse em se publicar um resultado ruim. De um modo geral, as instituições preferem publicar uma boa avaliação em um exame que não avalia absolutamente nada. É muito mais fácil, vende mais, interessa muito mais. Uma tremenda alienação. É claro que uma boa avaliação no ENADE pode coexistir com uma boa avaliação no EO. Todavia, somente a boa avaliação no ENADE não é parâmetro para atestar a qualidade de uma faculdade. Digo mais: uma boa avaliação no EO não é suficiente para atestar a qualidade de uma instituição de ensino superior, mas é um termômetro muito mais confiável que o exame promovido pelo Ministério da Educação. O ENADE funciona como um ladrão para um resultado ruim no EO. Sou capaz de apostar que se as faculdades que tanto divulgam o resultado do ENADE tivessem também um bom resultado no EO, o que estaria nas revistas é este último.

O terceiro ponto. A OAB não tem o interesse do governo federal, que é o de ampliar as ofertas de vagas do ensino superior. A política de cotas, o PROUNI, o REUNI, dentre outras ferramentas, têm o fito de no balanço geral chegar ao seguinte veredito: criamos tantos milhões de vagas para o ensino superior; o ensino superior é acessível a todas as camadas sociais; o PSBD é elitista – essa não poderia faltar. O governo aposta naquilo que enche os olhos em detrimento daquilo que eleva o nível da sociedade: quantidade em vez da qualidade. Assim, facilita a entrada do estudante nas faculdades pelo ENEM, que é uma prova muito mais tranquila que aquelas elaboradas em momento anterior a esse exame – tem sido considerada difícil muito mais pela reserva de vagas do que pelo seu conteúdo. Posteriormente, avalia a instituição de ensino superior com o ENADE, que, repito, de nada acrescenta a qualquer coisa. Amplia-se o gargalo para a entrada de estudantes e cai a qualidade das instituições. A reforma, como todos sabem, deve ser na base – vem sendo feita? Não! Basta olhar os índices nacionais e internacionais que avaliam o Brasil nesses critérios. A reforma na base educacional não interessa aos números, não enche os olhos. A promoção política e a aposta na ignorância (atenção: no sentido de não saber) da população formam um binômio muito interessante para quem almeja o poder pelo próprio poder.

Havia mais pontos, mas esse post já está grande e isso o torna cansativo. Então, é isso.

Até mais!

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